terça-feira, 27 de fevereiro de 2018


DIÁRIO DE UM CINQUENTÃO NA ACADEMIA.




Acabei de completar 56 anos.
Minha mulher me presenteou com uma semana de treinamento físico em uma boa academia. Estou em excelente forma, mas achei boa idéia diminuir minha “barriguinha”.
Fiz reserva com a “personal trainner” Nádia, instrutora de Aeróbica e modelo de 26 anos. Foi-me recomendado levar um diário para documentar meu progresso, que vai transcrito a seguir.
*Segunda-feira*
Com muita dificuldade levantei-me às 6 da manhã. O esforço valeu a pena.
Nádia parecia uma deusa grega: ruiva, olhos azuis, grande sorriso, lábios carnudos e corpo escultural. Inicialmente, fizemos um tour pela academia para conhecer os aparelhos.
Comecei pela bicicleta. Ela me tomou o pulso, depois de 5 minutos, e se alarmou, pois estava muito acelerado. Não era a bicicleta, mas ela, vestida com uma malha de lycra coladinha. Desfrutei do exercício. Ela me motiva muito, apesar da dor na barriga, de tanto encolhê-la, toda vez que ela passa perto de mim.
*Terça-feira*
Tomei café e fui para a academia.
Nádia estava mais linda que nunca. Comecei a levantar uma barra de metal. Depois ela se atreveu a por pesos! Minhas pernas estavam debilitadas, mas consegui completar UM QUILÔMETRO. O sorriso arrebatador que Nádia deu me convenceu de que todo exercício valeu a pena… era uma nova vida para mim.
*Quarta-feira*
A única forma de conseguir escovar os dentes foi colocando a escova sobre a pia e movendo a cabeça para os lados.
Dirigir também não foi fácil: estender os braços para mudar as marchas era um esforço digno de Hércules, doía o peito e minhas panturrilhas ardiam toda vez que pisava na embreagem. Fisicamente impossibilitado, estacionei meu carro na vaga para deficientes físicos, até porque, saí mancando.
Nádia estava com a voz um pouco aguda a essa hora da manhã e quando gritava me incomodava muito. Meu corpo doeu inteiro quando ela me colocou uma cinta para fazer escalada.
Pra que merda alguém inventa um treco pra se escalar quando isso já está obsoleto com os elevadores? Nádia me disse que isso me ajudaria a ficar em forma e desfrutar a vida… ou alguma dessas merdas de promessas.
*Quinta-feira*
Nádia estava me esperando com seus odiosos dentes de vampiro escroto.
Cheguei meia-hora atrasado: foi o tempo que demorei pra colocar os sapatos. A desgraçada me colocou para trabalhar com os pesos.
Quando se distraiu, saí correndo e me escondi no banheiro. Mandou outro treinador me buscar e como castigo me pôs a trabalhar na máquina de remar… me estrepei todo.
*Sexta-feira*
Odeio essa desgraçada.
Estúpida, magra, anêmica, chata e feminista sem cérebro!
Se houvesse uma parte do meu corpo que pudesse se mover sem uma dor angustiante, eu partiria no meio a vaca que pariu essa xexelenta.
Ela quis que eu trabalhasse meus tríceps… EU NEM SEI O QUE É ESSA BOSTA DE TRÍCEPS, QUE SACO!!!
E se não bastasse me colocar o peso para que o rompesse, me colocou aquelas merdas das barras… A bicicleta me fez desmaiar, e acordei na cama de uma nutricionista, uma idiota com cara de mal amada que me deu uma catequese de alimentação saudável, claro.
*Sábado*
A lazarenta me deixou uma mensagem no celular com sua vozinha de lésbica assumida, perguntando-me por que eu não fui.
Só com a vozinha me deu gana de quebrar o celular, porém não tinha certeza se teria força suficiente pra levantá-lo; até mesmo pra apertar os botões do controle remoto da tevê tava difícil…
*Domingo*
Pedi ao vizinho pra ir à missa agradecer a Deus por mim por essa semana que terminou.
Também rezei pra que o ano que vem, a infeliz da minha mulher me presenteie com algo um pouco mais divertido, como um tratamento dentário de canal, um cateterismo ou, até mesmo, um exame de próstata.



segunda-feira, 26 de fevereiro de 2018


NÃO HAVERÁ EMAIL DE MADRUGADA
Rapazes, eu tenho um talento secreto. Sou ótima pra escrever e-mails
românticos de madrugada. Somente um seleto grupo de cavalheiros tem
acesso a essa biblioteca privada. Mas eu estou aqui pra anunciar que o clube
fechou. Deixem em branco os formulários. Cancelem os boletos bancários.
Rasguem as carteirinhas. O clube fechou por razões sanitárias e de insanidade.
Parei.

Parei de despejar meu coração como leite morno digital. Minha doçura era puro
aspartame. Me dava taquicardia e atormentava os pensamentos, me levando a
construir frases insanas como: “Não deu certo, mas tudo bem. Vamos tentar na
próxima vida.” Mentira. Não tá tudo bem. Você foi péssimo. Por favor, não me
procura na próxima vida. Eu te amei de verdade, mas sério: fica longe de mim.

Parei de planejar minhas palavras como quem arquiteta uma armadilha. Sei
escrever o que vocês querem ouvir. Finjo como uma poetisa de verdade,
acreditando piamente em cada palavra. Sou ótima pra seguir direções, e vocês
as espalham da mesma forma que largam meias sujas pelo chão. “Não consigo
dormir, fico pensando em você." E quando eu te tenho manso e feliz dentro da
minha gaiola, eu abro a portinha e te deixo sem teto.

Parei de escrever como uma terrorista. Sequestrar atenção com bombas de
sinceridade. Liberar elogios como se fossem reféns. Exigir pelo megafone um
amor incondicional e um helicóptero (porque todo sequestrador que se preze
quer um helicóptero). E quando a fuga falha, eu confo sem tortura, todo meu
amor. Só não consigo dizer o que eu não gosto. Me contorço a cada
eletrochoque, tentando a última barganha: eu faço você se sentir bem consigo
mesmo e você gosta mais de mim.
Ainda bem que nem sempre funciona. Ou agora eu poderia estar no meu barco
de salvação preferido: o relacionamento sério. O clube fechou. Não haverá mais
e-mail de madrugada.

Não haverá revelação. Não haverá confissão. Não haverá
poema de aspartame.
Não é que eu não esteja escrevendo. Listo tudo que eu gosto em um. Dou
replay nos movimentos do outro. Re-significo todas as coisas que me falaram.
Na minha cabeça, vocês são fascinantes, vocês deviam ver. Mas agora, escrevo
tudo isso pra mim. Porque eu não sei outra maneira de entender as partes
obscuras da vida. E o que há de mais obscuro no mundo que o coração de um
homem?

Eu adorava escrever carta. Era só um pedaço de papel mas me embrulhava
pra presente. Me desdobrava como um mapa. Doava todos os meus pertences,
como num testamento. Mas parei. Porque eu não sou um presente, eu não posso me dar. Eu não sou uma guia, eu não posso te levar num passeio turístico pela minha alma. E o testamento, veja bem, eu não morri
ainda. Estou viva e sou uma escritora. Não uma terapeuta.

Então a partir de agora, minha escrita é pelo ofício da escrita. Não pra fazer
homens inseguros, confusos e indisponíveis se sentirem melhores sobre si
mesmos. Parei de trair a minha escrita com vocês. E se os colegas não
conseguem me entender por conta própria, simplesmente significa que nenhum
de vocês é o cara. O cara que um dia vai olhar pra esse emaranhado amorfo e
confuso que eu chamo de coração e dizer, sem pestanejar: é você.

Não haverá atalho. Não haverá fermento. Não haverá carta coringa. Não haverá leite morno pra disfarçar meu gosto amargo, seja corajoso. Parei de me traduzir, seja autodidata. Parei de pregar os benefícios do meu afeto, tenha um pouco de fé. Parei de explicar que eu sou uma boa pessoa. Olha nos meus olhos e você vai saber. Sério, tá
bem aqui.
Parei de tentar me provar.
Prove-se você pra mim.

(Andrea Yagui)




às vezes a gente vai querer mudar de pele, de horizonte, de coração. uma manhã, depois de aguentar muitos dias ruins, iremos querer mudar de rota. de caminho. de pessoas. e relações. de faculdade, às vezes Estado, e até país.
e nesses dias, mais duros e cinzentos, você vai se lembrar desse texto aqui porque ele é pra te dizer que você, eu, todos nós, estamos existindo da melhor maneira que podemos. eu juro pra você que todas as vezes que você se sente fraco, uma estrela lá no céu resguarda tua pele. algum Deus intercede por você. algum amigo, familiar, ou até estranho, agradece sua existência.
hoje eu agradeci por você existir. foi enquanto eu lavava a louça e percebia que minha companhia era o poste mais luminoso de todo o bairro. e sorri, depois de tomar um café, depois de conseguir fazer minha própria comida, depois de escrever sobre como o amor salva. e ele salva mesmo. o amor, a resiliência.
resiliência, pra mim, é justamente quando a gente tá nas últimas já, quase desistindo, e vem algo-alguém-alguma-coisa e nos empurra. aquele empurrãozinho pra gente chegar no dia seguinte e dizer: eu sou do caralho! eu vou enfrentar esse mundão e nada vai me impedir.
pois é. nada pode impedir você de crescer. de amadurecer a pele, o coração, as certezas. porque eu te juro que toda dor só aparece porque depois vem coisa boa. minha mãe previa chuva no dia seguinte quando as estrelas se movimentavam e o céu transformava-se. ele ficava limpinho e eu sabia que era pra anunciar alguma coisa.
e lembra que eu te disse no começo desse texto que estamos dando nosso melhor?
e estamos. hoje pode ter sido o pior dia da sua vida. e se você está aqui, lendo isso, significa que a resiliência está tatuada na tua pele. que ela está agindo sobre você e te permitindo viver mais um dia, respirar mais um pouco, sentir o ar novamente.
o ar que passa na sua janela agora. o mar do final de semana. o sol que vai cumprimentar seu corpo amanhã. as conversas, o bar, a cerveja gelada, aquele livro que você quer tanto comprar, uma-nova-pessoa se abrindo pra você. você mesma, sendo essa nova pessoa.
tá me entendendo?
o mundo gira. o universo cresce. pessoas vão e vêm. a vida é um céu que às vezes chove muito pra no outro dia vir calmo, manso e limpo. e vice-versa.
e eu só queria te lembrar isso mesmo.
que você está no caminho. que todos nós estamos.
sendo retrabalhados pela resiliência do agora, do enquanto-está-acontecendo
do amanhã-dias-melhores virão
porque eles vêm! eles vêm
e eu agradeço, de novo, tua existência.
agradeça que você está vivo também.

(Não encontrei o nome do autor)

Se não fossem as gargalhadas nos momentos exatos, a voz calada em outros. Se não fosse a maneira que acariciaram o seu cabelo e depois se ausentaram ou a maneira que lidaram com algo em você que antes ninguém nunca soube lidar. se não fosse as quedas, as escolhas, certas ou erradas, mas feitas por você mesma.
Você não seria você!
Todas as conexões feitas entre as suas células nervosas e a maneira que você reage frente às situações é resultado de todas as suas experiências vividas...
Então abrace as suas cicatrizes!
Elas também tornaram você o mais você possível!